
Voltemos um pouco atrás, ao meu embate com a meditação. Quantos já experimentaram meditar? Quantos desistiram rapidamente? Asseguro-vos que é precisa muita teimosia e persistência para se aprender a gostar de meditar. É contranatura para a mente ocidental.
Por isso, um dos meus defeitos – a teimosia – acabou por trabalhar a meu favor. Quando a minha intuição me diz que alguma coisa faz sentido, ainda que seja difícil, eu insisto e não desisto até prova em contrário.
A experiência de meditação foi uma destas coisas. Demorei anos a atingir o meu objectivo de ultrapassar o intenso desconforto físico e mental e, por vezes, conseguir atingir um estado de serenidade mental, abertura ao momento presente, sem julgamentos. É pena serem momentos tão efémeros.
Lamento informar os que têm a ilusão de que vão encontrar aqui a “pílula milagrosa” que vai resolver tudo da noite para o dia: este é um processo muito eficaz mas que exige disciplina, persistência e abdicar do controlo constante de tudo à vossa volta (digam lá que não se esforçam ao máximo por controlar tudo).
A meditação é um processo que não pode ser acelerado, não permite saltar etapas com cursos ou diplomas. Meditar é um estado de espírito, é uma forma de vida. E para lá chegar é preciso… meditar! Não há segredos nem atalhos.
E foi assim que, mesmo após a primeira experiência frustrante, insisti. E semana após semana, no horário habitual, lá estava eu para mais uma sessão de luta comigo mesma. Até que percebi, que para vencer, por vezes é preciso rendermo-nos. E abrir mão da resistência.
O CAMINHO COMEÇA NO PRIMEIRO PASSO
No final de uma das sessões, dirigi-me à pessoa que orientava a prática e perguntei-lhe como poderia conhecer mais sobre o budismo. Foi assim que, em meados de 2003, encontrei a minha “tribo”, num retiro na serra de Monchique, num espaço que ainda existe, renascido das cinzas dos incêndios de 2018 – o Karuna Retreat Center.
Tive o privilégio e a honra de assistir a um fim-de-semana de ensinamentos com um professor que os budistas designam como “um mestre autêntico”: um dos mestres de S.S. o XIV Dalai Lama. Nesse momento, descobri que já era budista e não sabia.
O ambiente no centro de retiros, o silêncio harmonioso e leve, os sorrisos hospitaleiros e afáveis, a interajuda e a atenção de todos para com todos. Marcou-me, especialmente, a atitude consciente como se movimentavam, falavam e simplesmente estavam. E apesar de sermos quase uma centena de pessoas naquele retiro, o ambiente era organizado e sereno. Estávamos todos juntos, mas cada um estava por si, cada um estava a fazer o seu caminho. Uma interdependência responsável e, ao mesmo tempo, independente.
Tudo o que fui aprendendo da filosofia budista, todas as práticas, todo o treino da mente, só reforçou a certeza de que encontrara o meu caminho.
COMO DEI O GRANDE SALTO
E assim, ganhei coragem e serenidade mental para dar o passo no vazio, impensável alguns anos antes: em meados de 2004, despedi-me.
A verdade é que eu não odiava o meu trabalho; mas não me davam condições para continuar a fazê-lo de forma minimamente saudável e eu tinha já tido uma paragem cardio-respiratória provocada pelo stress. Estava na altura de mudar de vida.
Revisão por: Cecília Maia